Fazendo vinho no papel – a lei brasileira

4 06 2010

Depois do selo fiscal, assistimos mais uma vez a tentativa de se fazer vinho só no papel no Brasil. A Portaria 259/2010 do Ministério da Agricultura põe em Consulta Pública nova Instrução Normativa que, entre outras coisas, vai determinar o que é um vinho Reserva, Reserva Especial e Gran Reserva.

Apesar da boa fé de quem deseja eliminar o marketing mau intencionado que denomina assim vinhos de baixa qualidade com intenção de se passar por bom aos olhos do consumidor, a lei, mais uma vez, tenta criar um padrão no papel que não existe na realidade.

Antes de determinar tempos de envelhecimento de vinho e o volume do depósito de madeira, é necessário saber se essas práticas e padrões contribuiram realmente para a melhoria da qualidade organoléptica do vinho.

Até hoje, a definição de vinho no Brasil é dada pela Lei 7.678, de 8 de novembro de 1988, que diz no artigo 3º que “Vinho é a bebida obtida pela fermentação alcoólica do mosto simples de uva sã, fresca e madura.”, ou seja, um objetivo, mas não a realidade. Por aqui, se sabe que se a uva estiver sã, dificilmente estará madura e se estiver madura, dificilmente estará sã. Além do mais, quem disse que não se pode fazer vinho de uvas podres ou de uvas vendes?

Enfim, primeiro é preciso determinar a qualidade em campo e, só depois, colocar no papel.





Maria Amélia falou e disse

12 04 2010

A Maria Amélia é nossa amiga de longuíssima data, e, recentemente veículou uma nota muito séria sobre o assunto do momento: O Selo Fiscal. Transcrevo abaixo o e-mail, dirigido ao Werner Schumacher, e enviado a um fórum eletrônico sobre vinhos. A Maria Amélia merece, sem dúvida alguma, as chaves de Vinhotopia. Bem vinda, nossa nova cidadã.

Werner

Eu cansei deste asunto. Gastei muito dinheiro com terapeuta e remédio pois meu trabalho era desmerecido e comparado ALL THE TIME com os preços da fronteira.
Eu acho que quanto mais onda eu escuto sobre selo, entidades, etc, mais me dou conta que eles não consultam os mercados onde o contrabando, etc, realmente acontece.
No caso dos vinhos finos – acima de 25-30 reais o contrabando não está só na maldade de quem faz de isto um negócio.
Aqui em POA, com três ou quatro telefonemas, vc compra qualquer bebida para seu evento com os preços mais baratos possíveis, entregues em sua casa, o que é de conhecimento de todos os lojistas, consumidores, etc. Se é ilegal ninguém se importa, mas nunca vi uma cidade onde se bebe tanta Freixenet, por melhor que seja o trabalho que a importadora daqui faça, é demais.
 
Os free shops são regulamentados em lei, brasileira e internacionais, mas só aqui alguém pode ir e trazer 48 garrafas.
Vamos considerar que vá um casal, dentro da lei, honesto: podem trazer 96 garrafas. (mas ninguém vai controlar se veio uma ou duas caixinhas a mais).
 
Se considerar que o casal bebe uma garrafa por semana, que é a média que se consome, eles já tem vinho para um ano inteiro e jantares com amigos.
O mesmo vinho que é vendido a R$ 30,00 – lá está o preço de 15,00 – mais ou menos: preço real menos os impostos.
Absolutamente nada mais do que isto.
TODOS os meus amigos pessoais (fora do setor de vinho: médicos, advogados, empresários, técnico informática, entre outras profissões), além de comprarem tudo na fronteira bem mais barato, ainda aproveitam o passeio, cassino e tudo de bom que tem lá. Eles não são culpados, não estão errados nem os digo para não irem. Eles fazem algo totalmente legalizado.
 
Hoje tenho plena convicção e provas reais que o que pago de imposto (seja o das minhas notas ou em cascata em qualquer coisa que compro) é mais do que minha empresa (ou qq uma) lucra.
O selo fiscal, então, é um lobby para mais um imposto, que só favorecerá à fronteira e ao contrabando.  E vai detonar mais um pouco as pequenas vinícolas…  e também importadoras – as quais eu acho que não DEVEM JAMAIS serem tratadas como “vilãs” ou “inimigas”, pois geram empregos e trabalham como POUCOS pela cultura e consumo do vinho no Brasil.
 
Só que sei que meu grito não fará muita diferença pois meu networking não é lobbystico, nem político. São de apreciadores que dizem o que pensam e que pouco se importam, querem viver bem gastando pouco (como todo o ser humano), ou pagar aquilo que vale pelo serviço que contratam, e desfrutar os melhores vinhos do mundo.
 
Então, é baixar a cabeça e trabalhar e esperar que se dêem conta com o tempo.
 
Imagino esta decisão como a favela construída em cima do lixão. Com direito a rua urbanizada e tudo mais.
Um monte de político, ong, fez aquela gente sorrir e achar que a vida podia ser um pouco menos pior, porém sem base.
Colocaram luz, água, até um pagodinho devia ter de vez em quando.
Até que veio a chuvarada e expôs a verdade, que todos já conheciam… .
A verdade sempre aparece, a natureza mostra.
Eu não tenho absoltuamente nada contra nenhuma pessoa envolvida, nenhum interesse, nem sei ao certo qual empresário, político ou qualquer um é o verdadeiro responsável. Eu só lamento. E se, ao fim de tudo, esta for realmente a única solução, aí tudo está realmente perdido.
 
Um abraço e espero não mais ter que falar neste assunto.
 
Maria Amélia”




o aroma de curral – Brett

8 04 2010

Recentemente, em uma degustação de vinhos aqui em Vinhotopia, houve uma grande discussão em torno de um assunto polêmico: aroma animal no vinho, é bom ou é mau?

Brettanomyces bruxellensis

Bem, vamos explicar. O vinho em questão tinha aroma clássico e bem nítido dos compostos deixados por uma levedura que costuma contaminar vinhos que passam por barris, a chamada Brettanomyces bruxellensis, que é da mesma família das mais amadas Saccharomyces cerevisiae. A Brett, como é chamada pelos íntimos, costuma parecer espontâneamente nos vinhos e está muito associada aos barris de madeira, usados na conservação de diversos vinhos. Como possui uma grande resistência ao álcool, sua contaminação é mais comum nos vinhos secos, quando estão sendo amadurecidos nos porões das vinícolas.

O ataque da Brett aos vinhos causa o aparecimento de aromas bem característicos, descritos como: esterco, curral, urina, suor de cavalo, medicinal, band aid e plástico queimado. A intensidade desses descritores varia de vinho para vinho e do grau de ataque desta levedura.

Mas o caso em questão é se isso é bom ou ruim para o vinho. Aí, meus amigos, depende. Se o ataque foi pequeno e a intensidade e a nitidez destes aromas é bem moderada, para um vinho que apresenta outros atributos positivos, pode até colaborar para a complexidade, sem, no entanto, estragar o vinho. Por outro lado, se a nitidez e a intensidade forem muito pronunciadas e aromas como suor de cavalo e esterco dominam o vinho, por favor, esqueçam a suas memórias de infância. Cavalo é bom para andar e esterco para adubar, para beber: não dá!





O vendedor de vinhos

7 04 2010

Em Vinhotopia não há lojas de vinhos. Aliás, os vinhos por aqui nem preço têm. Esse é um atributo que deixamos para fora de nossas fronteiras. Mas por aqui há sim o vendedor de vinhos. O nosso vendedor não é aquele que nos indica os melhores preços nem aquele que tenta perceber em nossa cara se temos dinheiro para gastar com isso. Pelo contrário. Aqui, o vendedor é o facilitador. Diante de tantas opções, de tanta diversidade, escolher sem alguém para ajudar é realmente para poucos.

Aqui em Vinhotopia, vendedor que não conhece o produto não é vendedor. É claro que, nem todos os produtos que ele oferece, ele conhece de ter bebido. Nem exigimos isso aqui. O importante, é que ele tenha a ideia do que o produto pretende oferecer. Sua tipicidade, seus principais caracteres sensoriais, seu estilo como um tudo. E se bebeu, claro, a sua opinião é sempre bem vinda.

Mas o melhor de tudo por aqui é que a venda não ocorre por interesses puramente comerciais, mas também os há, não é por falta de preço que não haveria interesses comerciais nessas transações, mas é o gosto e o prazer o que fala mais alto.

É tão bom viver num mundo de vinho onde não tem interesses comerciais tão pesados por trás de tudo, que parece um sonho essa terra de Vinhotopia.